Mônica Vermelha

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quarta-feira, 28 de maio de 2014

“Meu caro amigo”

Carta a um manifestante do movimento “não vai ter copa”.


 “Meu caro amigo”,

 
Em primeiro lugar quero te dizer que apesar de ver alguns equívocos no discurso e mesmo nas reivindicações deste movimento que você avaliza, acho que ele chama a atenção para algumas questões importantes e justas como o problema das remoções que foram feitas, talvez em sua maioria, sem a observação de alguns critérios mínimos que garantissem respeito aos desalojados e aos seus direitos de cidadania e também a questão do autoritarismo da FIFA que, de fato, assumiu aqui poderes exorbitantes e completamente ilegítimos, e ainda a questão da violência policial – principalmente das PM’s – contra pobres e manifestantes. Infelizmente nenhum destes problemas é novo para nós e nenhum deles está associado exclusivamente à COPA, talvez a ingerência da FIFA, mas, sabemos que ingerência de órgãos estrangeiros no Brasil não é exatamente uma novidade e, em muitos outros momentos de nossa história, ela foi, e é, infinitamente mais maléfica e danosa.
Ressalto ainda que acho pertinente o argumento da visibilidade que a Copa proporciona às causas dos diversos movimentos sociais e trabalhistas, eu, que já participei de inúmeras manifestações e passeatas nesta minha vida, sei que é importante dar visibilidade ao movimento, criar “fatos políticos”, “incomodar” patrões, gestores públicos e mesmo a sociedade. Ok, fiz-te um afago, né? Pois agora vamos lá tentar ver as coisas por um outro prisma? Eu considero que você não é um ingênuo, você tem bastante conhecimento histórico e político do nosso país, não é? Considero também que, embora você possa ter dúvidas quanto à autenticidade da esquerda no Brasil e no Mundo nestes nossos tempos, você sabe que a direita brasileira tem existência muito concreta e poder econômico e midiático incomensuráveis, certo? Sabendo estas coisas você saberá também que o movimento “não vai ter copa” não é um movimento direitista ou majoritariamente direitista, mas é um movimento que está sendo CAPITALIZADO pela direita brasileira, todo este clima de instabilidade, insegurança, descontrole e violência que o movimento já criou e promete exacerbar nos próximos dias, soa como música clássica aos ouvidos direitistas da nossa destronada e inconformada elite. Por quê? Porque apoiada neste contexto nossa tão democrática mídia vai “mostrando” (lembra aquele papo de lavagem cerebral?) ao povo a “incompetência, a inépcia, o autoritarismo e a insensibilidade” da nossa Presidenta que, como você sabe, por não ser a única (eu acho que também não é a maior!) responsável (culpada) por todos os problemas, não pode e nem vai conseguir resolvê-los no tempo que os manifestantes gostariam e eu também, confesso. Já sei, você está pensando agora – talvez involuntária e inconscientemente influenciado pela nossa tão isenta mídia -, ela vai fazer o discurso do medo! Mas não, eu não vou fazer o discurso do medo, eu vou fazer o discurso da consciência e da responsabilidade. Você precisa pensar, analisar e projetar as consequências possíveis caso o caos seja verdadeira e definitivamente instalado neste país – olha que para a grande mídia o caos já está instalado há muito tempo, ela só fala disso! Eu acho que se o “não vai ter copa” conseguir inviabilizar a copa e/ou acirrar o clima de guerra nas ruas, a consequência mais provável é a “oposição” conseguir voltar ao governo nas próximas eleições, não ao poder, porque do poder ela nunca saiu! Se é isso o que você quer, se é isso que você acha que é melhor para o Brasil ou se você acha, honestamente que não faz diferença, tudo bem, você tem o direito de achar, vá em frente! Agora, pode ser que você esteja pensando que não, você não quer, de forma nenhuma, que a “extrema direita” volte ao governo, você talvez considere que, apesar de todas as críticas que merece, o atual governo é melhor ou menos pior... o que você quer é apenas tensionar ao máximo o governo para que ele entenda que precisa mudar, avançar, ir além, negociar, democratizar... Ok, legal, mas aí é preciso ter cuidado, porque além de você – manifestante -, tem vários outros atores neste cabo de guerra, puxando para o mesmo lado, mas com força e intenções bastante diferentes e aí a corda pode arrebentar e nós já sabemos quem é que vai para a lona quando a corda arrebenta, não é? Meu caro amigo não sei se consegui me fazer entender e sei que provavelmente você vai achar meio suspeito o meu discurso, mas eu ando muito preocupada com o destino deste povo pobre, lascado e que durante 500 anos só conheceu a miséria, a fome e a desigualdade. Posso te dizer que, sem dúvida, eu gostaria que o governo petista já tivesse resolvido todos os problemas que acumulamos ao longo de nossa história, mas, infelizmente, isso é infinitamente mais difícil do que eu e você gostaríamos que fosse... NESTE cabo de guerra – da igualdade, da justiça, da dignidade para todos os brasileiros - do outro lado estão partidos que nunca se preocuparam com o povo, está uma mídia concentrada e sem compromisso com a verdade e a pluralidade, está uma justiça cega no pior sentido que isso pode ter, uma justiça que fecha os olhos propositalmente diante das injustiças, está um empresariado que persegue o lucro cada vez maior a qualquer custo, estão igrejas encasteladas e alienantes, está uma classe média cega e pouco solidária... Como eu acho que nós temos muito, mas muito mesmo, que avançar, eu não gostaria de regredir... nem um milímetro! E principalmente, eu não gostaria que as pessoas que estão lutando, com honestidade, com verdade, por mudanças, por avanços, contribuíssem, desavisadamente, para o retrocesso!

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