Há muitos
anos atrás, participei, em Itaúna, da fundação da APAC - Associação de Proteção
e Assistência aos Condenados. Já naquela época, e ainda hoje, ouvia protestos
indignados de pessoas bem intencionadas e inteligentes. "Como assim,
proteção aos condenados??? E as vítimas??? Você está participando de um negócio
que visa proteger assassinos, ladrões, estupradores etc?'
Bom, era meio difícil
explicar, porque a pessoa que faz um questionamento nesses termos, normalmente,
não está disposta a ouvir explicações. Mas o tempo passou, a APAC cresceu e a
lógica que nos impulsionou naquele momento, continua tão válida quanto antes.
Quando um
réu é condenado, a sociedade diz a ele, teoricamente: "você errou feio,
cometeu um crime, você é perigoso para a sociedade, você vai ficar preso para
pagar pelo que fez e para ver se você se emenda." E aí o criminoso vai
para a cadeia para fazer duas coisas, basicamente: pagar pelo que fez e se
recuperar. E é aí que "a porca torce o rabo".
Primeiro:
pagar por um crime, é algo praticamente impossível, não se paga uma vida perdida,
um trauma sofrido, nem mesmo um patrimônio perdido, porque raríssimas vezes a
vítima recebe de volta aquilo que lhe foi tirado. E, sem fazer nenhuma
reparação à(s) vítima(s) - o sistema penitenciário não lhe cobra isso - o
criminoso é colocado na cadeia para "apodrecer" lá; aí ele vai sofrer
todo tipo de privação, de humilhação, vai ser tratado como um lixo social.
Moral da história: a idéia que fundamenta esse sistema não é a da justiça, é a
lógica do "olho por olho, dente por dente", é a da vingança, e a
vingança, todas as pessoas de bem já sabem, não faz nenhum bem a ninguém.
Segundo:
bom a segunda parte é ainda mais dramática e absolutamente contraditória, a
sociedade quer que o condenado, depois de passar anos sendo maltratado,
humilhado, espancado (sim, a tortura segue reinando firme e forte nos nossos
presídios, alguém duvida?), depois de fazer tudo para que aquele ser humano
perca o seu último resquício de humanidade; ela quer que ele volte para o
convívio social e se reintegre à sua comunidade. Bom isso só aconteceria se o
condenado fosse um santo e convenhamos, não há muitos santos na prisão,
há alguns santos sim, porque embora nos recusemos a pensar nisso, é fato
inegável que a "justiça" erra e condena pessoas inocentes, talvez
mais do que a gente ousa imaginar; mas isso é outra história.
O fato é
que existe uma contradição letal no sistema: ninguém se recupera ou se
ressocializa depois de ser lenta e profundamente animalizado, torturado,
embrutecido, depois de ter a sua dignidade morta e sepultada. E um dia esse
criminoso vai ser solto ou vai fugir da prisão (parece que ninguém pensa
nisso!) e aí é a sociedade que vai pagar pelo seu crime. Sim o que se faz com
os presos desse país é um crime, não é apenas um crime contra os criminosos, é
um crime contra a sociedade que paga sofrendo o aumento da violência, vivendo
cercada e aterrorizada constantemente.
Enfim, o
nosso sistema penitenciário é um troço totalmente desprovido de sentido: ele
pune mais a sociedade do que o criminoso e não recupera ninguém, só transforma
pessoas em feras acuadas. Há que se rever tudo isso, para provar que somos
civilizados!
Ps. Vale a pena conhecer a
filosofia e os métodos da APAC.
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